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TORTURA E A MÍDIA

  • emmteixeira
  • 19 de mai. de 2017
  • 9 min de leitura

Como a mídia possui um poder enorme e, devido aos seus próprios interesses, ela acaba influenciando as respostas que a sociedade dará, assim como também, os seus pensamentos. A mídia eletrônica (não só o rádio e a televisão, mas todas as formas de comunicação, tais como o jornal e a internet) passou a se tornar o espaço privilegiado da política. Não que toda a política possa ser reduzida a imagens, sons ou manipulações simbólicas. Contudo, sem a mídia, não há meios de adquirir ou exercer poder. Portanto, todos [os partidos políticos, de ideologias distintas] acabam entrando no mesmo jogo, embora não da mesma forma ou com o mesmo propósito. A mídia, desde sua ascensão é popularmente conhecida como "quarto poder" - em referência aos três outros, estatais, o que, por si só, expressa a influência que possui. Daí, para muitos, o "quarto poder" representar, de fato, o "primeiro poder", dada a capacidade de influenciar a agenda política.

Escola Base é um grande exemplo do poder da mídia. Ela foi uma escola particular localizada em São Paulo. Em março de 1994, seus proprietários, uma professora e o seu esposo e motorista foram injustamente acusados pela imprensa de abuso sexual contra alguns alunos de quatro anos da escola. Em consequência da revolta da opinião pública, a escola foi obrigada a encerrar suas atividades logo em seguida. O chamado Caso Escola Base envolve o conjunto de acontecimentos ligados a essa acusação, tais como a cobertura parcial por parte da imprensa e as atitudes precipitadas e muito questionadas por parte do delegado de polícia, responsável pelo caso, que, supostamente, teria agido pressionado pela mídia televisionada e pelas manchetes de jornais. O caso foi arquivado por falta de provas. As pessoas acusadas no caso passaram a sofrer de doenças, além de se isolarem da comunidade e perderem seus empregos.

Nesse infográfico podemos perceber como a sociedade confia muito mais na imprensa do que em diversos outros órgãos públicos.

Vivemos em uma sociedade mediada pelos meios de comunicação. Meios – ou melhor, instituições – que são detentores de interesses políticos e econômicos. Essa mediação tanto interfere na agenda política quanto no próprio fazer político, hoje indissociável da comunicação. Por isso, é importante defender e lutar pela democratização das comunicações. Tudo isso para que, por exemplo, não sejam usados para atentar contra direitos, como vemos cotidianamente, e a própria democracia.

A liberdade de imprensa é uma conquista legítima e imprescindível a todo regime democrático de direito, cuja importância é inquestionável, entretanto, há que se observar a necessidade de impor limites. Isto porque o poder desta liberdade é muito grande, e, se for excedido, pode cercear a democracia e o respeito à população, dentre outros direitos. Desta forma, é necessário adotar critérios responsáveis na difusão de informações para que não se extrapole os limites constitucionais.

Os veículos de comunicação em massa acabam por manipular quando trata os cidadãos como seus clientes ou seus consumidores ao invés de tratar como pessoas que buscam um maior grau de conhecimento a partir do acúmulo de informações. Essa manipulação gera domínio e facilita o manejo sobre a conduta das pessoas, na medida em que mitiga a possibilidade de pensar criticamente. Note-se ainda que as informações estão sendo veiculadas em grande velocidade, o que não permite a análise mais detida acerca de veracidade ou do contraditório dos fatos apresentados. Os meios de comunicação constituem de fato a garantia a liberdade de expressão e de informação, mas, sem a devida responsabilidade, eles podem se transformar em instrumentos de manipulação.

Com um eleitorado que se pauta cada vez mais nos assuntos da moda para orientar o seu voto, os noticiários da TV acabam concentrando um grande poder consigo, visto que eles poderão influenciar a sociedade para algum lado, dependendo da tônica que derem às matérias veiculadas, também podendo modificar a agenda política das campanhas com esse conteúdo.

Notícias tendenciosas, a sua veiculação podem causar danos a pessoas, instituições, grupos sociais e às sociedades, na medida em que possui (a notícia) o poder de, no limite: fabricar e distorcer imagens e versões a respeito de acontecimentos e fenômenos, simultaneamente à sua função de informar. É claro que não se trata de considerar o processo de informar como neutro, pois ele próprio é submetido a um conjunto de variáveis, tais como a visão do consumidor das notícias, das testemunhas, das fontes, e do próprio "processo produtivo" das notícias, intrinsecamente complexo.

Por todos esses motivos, é imprescindível que haja responsabilidade e interesse social na atividade informativa. Dessa forma, a mídia, ao participar da esfera pública como "prestadora de serviços", isto é, teria uma função imprescindível nas democracias: informar sobre os acontecimentos levando às pessoas uma gama de dados que, sem esse serviço, não teriam condição de conhecer outras realidades que não as vivenciadas ou relatadas por pessoas próximas. Mais importante, os órgãos da mídia fariam a fiscalização do Estado, exercendo assim a forma mais bem acabada de "controle social": em relação ao dinheiro público, às ações públicas, numa palavra, aos negócios públicos. Portanto, um sistema de comunicação democrático é essencial para a democracia.

O retrato que escolhemos para exemplificar a centralidade da mídia na política foi a tortura no período da Ditadura Militar Brasileira, mas para entendermos melhor este assunto, o grupo concordou que seria necessário dar um parâmetro dos conceitos sobre tortura e como ela continua presente na sociedade atual.

Esta frase é de um artigo que utilizamos como fonte, que tem como título: os crimes de tortura e o princípio da dignidade humana, de Adriano Mendes Teixeira. Ele traz algumas questões referentes a degradação da dignidade das pessoas que sofrem a tortura. Isso se mostra bastante no trecho: ” Todas as formas de tortura têm em comum o fato de que degradam e destroem a dignidade humana. Seus efeitos sobre a vida humana são devastadores e muitas vezes irreversíveis”.

O autor também mostra que a tortura quase sempre esteve presente na sociedade, inclusive na antiguidade, ou seja, esta é uma prática já consolidada nas sociedades humanas.

Mas este tema começou a ser discutido principalmente após a segunda guerra mundial, quando os governos começaram a se movimentar para criar leis e documentos que assegurassem a garantia dos direitos humanos. Entre elas está a Convenção Contra a Tortura (1984), que foi ratificada pelo Brasil em 1989. Ela foi um marco pois previa a punição aos torturadores, mas não só isso, definiu a criação de um comitê que analisaria e fiscalizaria a proteção contra este tipo de crime.

A tortura no Brasil pode ser considerada uma prática cultural. Marcos Rolim afirma que desde o início da colonização, índios e afrodescendentes já eram torturados, e isso para a sociedade era totalmente comum. Hoje nos chocamos com as atrocidades cometidas pelos senhores de engenho e capatazes, mas não nos damos conta que a cultura da violência ainda permanece até os dias atuais. Em seu texto explica que “ nunca tivemos no Brasil o tipo penal “torturar alguém”, porque nossas elites, nós mesmos, aqueles como nós, fazem três refeições por dia, tem carteira assinada, frequentam as universidades, via de regra, não estão nem aí para os torturados, desde que sejam pobres, marginalizados, negros, suspeitos da prática de crimes, prisioneiros. O que nos importa? É evidente que a tortura é um horror quando atinge um dos nossos. Ela nos pareceu inaceitável quando foi, em um passado recente, praticada contra presos políticos”. Neste trecho o autor se refere ao período da Ditadura Militar Brasileira, e usa este exemplo para deixar claro a diferença de importância entre os torturados da época: estudantes, músicos e famosos guerrilheiros e os da atualidade que normalmente nascem nas favelas, muitas vezes não conseguem chegar à universidade e não tem representatividade na sociedade.

Analisando este aspecto podemos perceber que a tortura não é um assunto do passado, ela não é uma exclusividade de período ditatorial brasileiro, mas ocorre sim, todos os dias desde que o país foi colonizado pelos portugueses, o que muda somente, é quem é a vítima e a empatia que a sociedade em geral tem com ela.

Um pouco por causa dessa construção social que vivemos, associamos muito a tortura apenas com os casos ocorridos nos anos do regime militar, mas se estudarmos a fundo o assunto nos damos conta do quanto este conceito permeia o dia-a-dia da sociedade brasileira de diversas formas. Alguns dos tipos de tortura são: psicológica; contra a mulher, o idoso e a criança; preconceito; xenofobia; física; sexual; patrimonial; moral e por motivos políticos.

Esta cultura da violência e da tortura começa muitas vezes na escola, o primeiro contato com a sociedade fora do contexto familiar já é rodeado de perseguições, tensões e muitas vezes até agressões físicas que tem motivos variados. Este pode ser o primeiro contato com este tipo de violência, e que se não for trabalhado da forma correta pode acabar normalizando atitudes aterrorizantes e irreversíveis.

Neste exemplo os dados chegam a falar por si só, lembrando que estes números são os contabilizados pelos órgãos e instituições que fazem as pesquisas, e normalmente são feitas a partir de denúncias, o que não é uma prática muito comum no Brasil. Ou seja, os números já são alarmantes mesmo não sendo um retrato real da sociedade. Não há confiança na polícia, nas prisões e muito menos nas punições para os torturadores, que normalmente saem impunes dos casos.

Existem alguns casos que se destacaram na mídia, como o caso Amarildo, as rebeliões nas prisões que ocasionaram diversos tipos de tortura, inclusive decapitações. Lembrando também que não é responsável pela tortura apenas quem a pratica, mas também quem consente e está ciente dos atos.

O filme Tropa de Elite é uma crítica à polícia do Rio de Janeiro que deu errado, o filme mostra em sua maioria policiais corruptos e que normalmente abusam do poder adquirido por eles para prática de violência. Mas a fama do filme não se deu devido à crítica, mas pelo fato de ser um filme violento, que mostrava a polícia fazendo seu “verdadeiro trabalho”, o de exterminar bandidos e “reestabelecer a paz” em uma das maiores cidades do país. Este é mais um exemplo claro de como a tortura e a violência são intrínsecas à cultura brasileira, pois poucos se sensibilizaram com as práticas aterrorizantes que os policiais praticavam, devido a normalização desta prática, e muitos exaltavam a fala do Capitão Nascimento que dizia “para o povo, parceiro, bandido bom é bandido morto”.

Trazendo agora um pouco a forma como a mídia retrata a tortura, não podemos dizer que ela não dá espaço para este assunto, é raro, mas em nossas pesquisas conseguimos encontrar textos sobre o assunto em diversos meios de comunicação, inclusive de grande porte como Globo, Folha e Estadão, e também em veículos mais alternativos.

O questionamento que fazemos nesta etapa do trabalho é, se de alguma forma a mídia retrata alguns casos, mas principalmente os dados apontados pela ONU e outras instituições com credibilidade mundial, porque continuamos não falando sobre o assunto? Porque a tortura é esquecida? Porque a sociedade não se interessa mais por este assunto e o deixa como um retrato do passado, sendo que no presente muitas pessoas ainda sofrem com isso?

Nesse terceiro e último tópico a gente vai falar sobre como a Ditadura e a tortura conseguiram caminhar ao lado da imprensa, como contribuiu para a manutenção do regime e também como ajudou na tortura dos militantes da oposição ao governo.

O Regime militar foi o período da política brasileira em que militares conduziram o país. Essa época ficou marcada na história do Brasil através da prática de vários Atos Institucionais que colocavam em prática a censura, a perseguição política, a supressão de direitos constitucionais, a falta total de democracia e a repressão àqueles que eram contrários ao regime militar.

Houve os dois na verdade. Segundo a historiadora Beatriz Kushnir que escreveu o livro Cães de Guarda - Jornalistas e Censores, do AI-5 à Constituição de 1988, que fala sobre. Enquanto a grande imprensa agia de forma a colaborar com a ditadura para se manter de “pé”, a imprensa alternativa, veículos de menor expressão nacional na época, resistiam e representavam mais fielmente o que foi a ditadura.

A grande mídia não só colaborou durante a ditadura, mas também anteriormente a ela, para que a mesma se instalasse. Dois exemplos claros e bem conhecidos, são os editoriais do Correio da Manhã intitulado “Basta” do dia 31 de março e “Fora!” 01 de abril. Publicados no auge do golpe civil militar.

“Suporte e fôlego para carimbar que o veículo estava sob censura ninguém teve. Que ideia, então, de resistência é essa? Resistir para manter o jornal aberto, para fazer o jogo do mercado? Ou resistência para comunicar à nação brasileira o que estava acontecendo? ”.

Beatriz Kushnir

Jornal O Pasquim, um dos representantes da imprensa alternativa da época, que trazia na capa uma faixa vermelha com os dizeres “SEM CENSURA” e também o editorial também intitulado “Sem censura não quer dizer com liberdade”, assinado por Millôr Fernandes.

A mídia ajudou de diversas formas para manutenção da ditadura, ajudou financeiramente, exemplo disso é o “patrocínio” feito pelo grupo Folha à Operação Bandeirante (OBAN), que foi um centro de informações e investigações montado pelo governo do Estado de São Paulo e pelo Exército Brasileiro em 1969, que a coordenavam e integravam suas ações às dos órgãos de combate às organizações armadas de esquerda durante o regime militar. A Oban posteriormente passa para jurisdição do DOI-CODI – que tinha como comandante, Carlos Alberto Brilhante Ustra, que foi o primeiro militar a ser reconhecido, pela justiça, como torturador durante a ditadura

Capa do jornal Folha da Tarde, do grupo Folha, com manchete sobre a morte do guerrilheiro Marighella, chamando o mesmo de “Chefe geral do terror”. Marighella foi alvejado a tiros durante a ditadura. A cena do crime foi alterada para parecer uma troca de tiros entre organizações armadas contra o regime e polícia, a farsa foi exposta pelo fotografo Sérgio Vital Tafner Jorge presenciou a cena onde os agentes alteraram o corpo de Marighella do local de origem e depois o obrigaram a fotografar a cena alterada para confirmar a versão dos agentes da ditadura.

Outro jornal da época que fazia parte da mídia alternativa, é o jornal Venceremos que durante três meses circulou trazendo na para os dizeres “Este jornal não é censurado pela ditadura. Viva Marighella”

Outra forma de ajuda da imprensa a ditadura, neste caso de bens materiais, são relatos de que os carros do grupo Folha seriam emprestados para utilização em emboscadas onde os torturados capturavam opositores ao regime.


 
 
 

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O observatório foi produzido para a certificação de Mídia: Tecnologia e Poder, do quinto ciclo dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Universidade do Sul de Santa Catarina no ano de 2017. 

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Bruna Nicoletti, Beatriz Wagner, Guilherme Martins, Marcela Teixeira e Matheus Roth.

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